Martha Pires Ferreira / 2011
Atividade terapêutica e criação
artística são fatores distintos. Terapêutico tem sua raiz na palavra terapia -
tratamento. Terapêutico é recurso/meio para aliviar ou mesmo curar uma pessoa de
doença, desequilíbrio ou desgaste mental/psíquico, físico e/ou emocional. Terapêutico
é um termo da medicina na sua prática.
Criação artística é
dar existência ao que não existe, é dar origem a algo. Simplesmente fazer
nascer.
Atividade terapêutica, ocupação
terapêutica, visa proporcionar satisfação,
melhora ou recuperação ao doente ou pessoa em estado alterado em sua natureza
fazendo-o trabalhar no processo criador, ocupar-se, com algo ativo que proporcione
bem estar. Se possível propiciar a cura de alguma pessoa com doença, e, que a
possibilite retornar ao seu estado normal de saúde emocional, física e/ou
mental.
O terapeuta médico ou técnico terapeuta,
ao conhecer seu cliente, dará um parecer e indicações terapêuticas -
encaminhará a pessoa em questão para a análise, psicologia analítica e/ou atividade
ocupacional criativa.
Pintar, dançar, escrever, caminhar,
praticar uma atividade física, ouvir música, pode ser terapêutico. É sempre
terapêutico fazer uma atividade que nos alivie de tensões, desgastes ou
desequilíbrios de nossas funções naturais (seja a função do músico, pintor,
filósofo, desenhista ou matemático) nos proporcionando um retornar à vida
normal, saudável. Quanto mais criativa for a atividade melhor os resultados.
Muitas vezes o/a artista caminha
pelas avenidas ou jardins, passa horas em silêncio, ouve música ou pratica um
esporte como terapia/alívio de tensões para depois retornar às suas atividades
criadoras, isto é, pintar, escrever, compor.
É sempre terapêutico sair da rotina e
fazer algo que seja atividade expressiva. Criação artística não pode ser
identificada com atividade terapêutica porque demanda um tremendo esforço intelectual,
muito desgaste emocional, concentração, imaginação e plena atenção das funções em uso. Não é exercer simplesmente
uma atividade terapêutica, é criar. Dar vida a algo inédito, novo. Quanto mais consciente
for do processo criador, melhor.
Há tanto desgaste no ato criador que
por vezes o artista adoece no simples exercício de sua criatividade, quando é
preciso procurar um antídoto, procurar uma atividade que o descanse, que o recupere
nas suas energias criadoras em
exaustão. Por vezes o criador (o/a artista) procura um
terapeuta para entender a si mesmo, ficar bem, para poder retornar às suas
funções de trabalho.
Criar não é apenas projetar emoções, alívio,
é suor, cansaço. É terapêutico tocar um instrumento, mas tocar não é por si
mesmo um ato de criar. Criar exige realizar emocional e conscientemente uma
obra inédita. Criar é mais que terapia, é ato criador. É inventar, exercer a
função imaginativa em sua originalidade. Mas não podemos negar a criação
espontânea, sem intenção. Pode alguém se propor, ou ser conduzido, a uma
terapia, e se revelar um criador, um talento artístico.
Atividade terapêutica é atividade com
a finalidade de tratamento. O artista não faz algo por ser terapêutico, e sim
porque deseja, precisa dar origem a alguma coisa. Pode acontecer de precisar
fazer análise, um tratamento que vise atividade terapêutica, neste caso ocorrerá
outro viés, um antídoto da habitual, como compensação das energias.
O que caracteriza a arte é a
originalidade criadora.
Para o compositor Carlos Jobim
caminhar pelo jardim Botânico era terapêutico na medida em que descansava ao
ouvir os pássaros. Convivia com a natureza e depois voltava para o seu piano e
refeito voltava a criar - dar existência a algo impensado. Para Jobim tocar
piano e compor não era terapêutico, era criar, suar, sofrer no bom sentido,
inventar, dar origem a cada nova composição.
Bach, Pixinguinha, Spinoza, Cesanne, Matisse,
Picasso, Paul Klee, Henry Miller, Thomas Merton, Cildo Meireles, Antônio Dias,
Manuel Bandeira, A. Einstein, Chico Buarque, Pitágoras, Heráclito, Freud, Carl
G. Jung, Nise da Silveira, Machado de Assis, eram/são criadores. Era
terapêutico para Jung trabalhar com as mãos, para Spinoza polir lentes e para
Nise da Silveira cuidar dos gatos e ficar em silêncio absoluto antes de
retornar as suas atividades criadoras.
No início dos anos setenta eu
afirmava: todo e qualquer ser humano é
potencialmente um criador. É da natureza humana querer inventar, criar, dar
vida a algo original. A criação artística não é o privilégio de um pequeno
grupo de artistas, nem o dom de uns poucos – verifica-se que todo ser humano é
potencialmente um artista-criador em maior ou menor grau.
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