quinta-feira, 31 de maio de 2012

Círculo do Lápis

Rosto - desenho à lápis, grafite, 2012 - 9 x13 cm.
Círculo do Lápis - arquivo - texto escrito em janeiro de 2005 - martha pires ferreira

A vida cotidiana, nos meios de comunicação, não pode ser reduzida ao novo paradigma tecnológico centrada, particularmente, na rainha da atualidade; a internet. A vida, ela própria, almeja, anseia, muito mais que aparelhos de comunicação por mais sofisticados e avançados que eles sejam para transmitir mensagens, idéias e saberes. Os papeis, livros, jornais, revistas, folhetins, e mais, continuarão a ter seus espaços tradicionais intransferíveis. O papel fala, canta, emite odores e imagem.
Sou adepta ao Lápis! Ao Círculo do Lápis!
O ser humano comum, dois a três quartos da população mundial, não terá alcance material e muito menos intelectual, tão cedo, para manejar aparelhos de larga potência. Ainda vivemos no mundo paleolítico e feudal.
O neoliberalismo, senhor dos mecanismos de controle de informações, leva grandes vantagens é claro, numa expansão incalculável frente aos múltiplos meios de comunicação. Tudo é nivelado de norte a sul conforme os interesses dos que dominam “as mídias”.
Espíritos avessos ao estabelecido surgem por arestas inesperadas. Movimentos renovadores e rebeldes diante do progresso “maravilhoso” surpreendem com novos gestos e olhares; um deles são os adeptos ao Lápis. Por várias circunstâncias e meios, se afastam dos computadores, dando distância. Fazem-se comunicantes, agentes, através de outros recursos impensáveis. Um deles é o Lápis, para o qual sou adepta, incondicional.
Intuitivos, introvertidos, amantes dos segredos ou mistérios da existência anseiam outros caminhos, outras práxis para sua via humana além da internet, percorrem a beleza do caminho pessoal, longe de provedores e intrusos tecnológicos.
Os adeptos ao Círculo do Lápis fogem de tudo que esmaga, controla, invade e torna lugar comum. A sua singular alternativa é o grafite, o velho lápis sensual, delicado e criativo. Sua caixinha também tem cores, todas as cores.
Quem ama os Lápis sabe dos seus manejos secretos e insondáveis, quase magia. Conhece o sentido do intervalo entre as palavras, entre um e outro rabisco ou número. O Lápis fala, se comunica, transmite sentimento, afeto e raciocínio metafísico. O Lápis é quase um ser humano, porque é vivo. Os Lápis engendram ideias, imagens e impulsionam ao transcendente. Quem conhece o Lápis, sabe.
O Lápis nos convida ao universo da simplicidade, do despojamento intelectual: “se queres ser tudo, não queiras ser coisa alguma”, “se queres possuir tudo, não queiras possuir coisa alguma”, João da Cruz, século XVI. Escrevia na ponta do lápis ou da caneta à pena com tinta? O simples escrever o levava, alquimicamente, ao essencial.
Na contramão da cultura, quanto mais seres humanos pretendem possuir, sofisticados aparelhos com tecnologia de ponta, as mais aprimoradas, o amante do Círculo do Lápis o que mais deseja é ter o mínimo para se dar ao precioso tempo para ser, sendo. Tempo e espaço.
O Círculo do Lápis não se faz nos modelos neoliberais, repleto de promessas consumistas e progressistas. O Círculo do Lápis se faz por outra via; a do despojamento, do vazio criativo, da sabedoria do ócio, da singularidade de não querer ter, possuir além do necessário, mas apenas viver sendo, hoje, aqui e agora, em verdade e beleza. Beleza além da filosofia, da ciência e mesmo da arte. A experiência do inefável, a riqueza íntima e pessoal que emerge das profundezas do ser. Os adeptos do Círculo do Lápis transmitem de traço a traço, de sensibilidade a sensibilidade. Divertem-se por amor e paixão ao ponto e a linha, ao rabisco, ao desenho, às palavras, à escrita e ao silêncio não pronunciado. O Lápis desenha enigmas da intimidade intuitiva, intelectual ou do coração.
Todo ser humano é potencialmente escritor de sua própria vivência. Todo ser humano é potencialmente desenhista, artista no coração do universo. Todo ser humano pode rabiscar; um rabisco pode ser a porta para a beleza criadora que emerge das profundezas do inconsciente e se faz revelação pessoal e única.
O Lápis é o mais simples e dos mais nobres instrumentos para engendrar imagens, expressões que se revelam em graça e beleza. MPF, janeiro de 2005. _____________

sábado, 26 de maio de 2012

Jardim Botânico

A beleza da Mãe Natureza nesta manhãzinha
- 26 de maio de 2012 
Caminhando em passos de eremita pelo Jardim Botânico, RJ.
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segunda-feira, 21 de maio de 2012

C. G. Jung - Lo inconsciente

    Jung cortando lenha - gostava da vida simples do campo 
          Leio em espanhol, uma das joias de C. G. Jung, Lo incosnciente, 12ª edición/Editorial Losada S. A., 2003, Buenos Aires. Já li suas reflexões profundas, sobre a vida interna e externa, abordagem desse livro, em português, mas não tenho a fonte; o volume onde se encontra. Suas obras completas existem em português.
          Recomendo esta viagem, este mergulho intelectual, que é ler Jung, para a compreensão da sua visão de inconsciente pessoal e coletivo. Vivência interna e externa. Tipos psicológicos. A natureza dos temperamentos nos diferencia na riqueza e complexidade que somos cada um no processo pessoal, penoso e transformador que é o da individuação; verdadeiro processo alquímico.
          Jung sempre me surpreende como um eterno bom velho mestre. Dos seus seguidores poucos me atraem além de Marie Louise Von Franz e Nise Magalhães da Silveira. Ler e reler Jung me basta para mergulhos cada vez mais interiorizados, para o conhecimento das energias que impulsionam nossa vida cotidiana da escuridão à luminosidade, do nascimento à morte, das experiências do relativo à transcendência.
          Para Jung não há separação do processo interior e exterior; somos Uno. Caminhamos em espiral, atentamente, para níveis cada vez mais depurados e aperfeiçoados.
          Jung é um dos preciosos companheiros em minha vida. Qualquer um pode compartilhar com ele nas viagens pessoais. Tenho a alegria de ter muitos sábios, santos e loucos criativos que fazem parte de minha jornada terrena. mpf __________

domingo, 13 de maio de 2012

Mãe atravessando o rio


Pergaminho chinês do séc. XIII - detalhe - artista desconhecido.
Gravura de uma revista - acervo - “Art Instite” de Chicago.
Homenagem às Mães com crianças atravessando
tranquilamente o rio da vida cotidiana. 

sábado, 12 de maio de 2012

Projeto Roubo Legal - Santa Teresa

O Poder Público junto a Rio Luz, e Região Administrativa, deveriam estar atentos aos saques do patrimônio histórico: Antigos Lampiões. E o IPHAN, nada sabe? 
Os antigos lampiões / luminárias que pertencem à beleza histórica da cidade do Rio de Janeiro são ou não tombados? Pouco a pouco estão sendo retirados velhos lampiões da Rua Dias de Barros e Rua Murtinho Nobre, Santa Teresa, misteriosamente, pelo Projeto Roubo Legal. O que já ocorreu por outras ruas do bairro, para não falar por onde mais desta cidade, denominada maravilhosa.
As imagens dos lampiões falam por si. Desculpas que estão velhos e não tem como recuperá-los.
Como diz um sábio operário diante do descaso e saques: “Chamem um chinês que ele colocará os lampiões limpos e funcionando, perfeitamente”.
Projeto Roubo Legal; denominação de um artista marceneiro, protetor amante dos bens históricos, que acompanha indignado os lampiões serem trocados pela feiura moderna.
Os lampiões com suportes de ferros trabalhados, roubados, saqueados, por vezes na calada da noite, já estão locados em alguma fazenda ou sítio? Para onde foram? Gostaríamos de ter o endereço. m.p.f. ______

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Cecília e Bandeira - memória

De repente tenho saudades das vezes que vi ou estive com Cecília Meireles e Manuel Bandeira. Na minha juventude esbarrei, no caminho, com notáveis da nossa cultura brasileira. Relendo este dois poetas e vendo fotos tão expressivas, voltei-me ao passado com olhos abertos e a carne viva. Escreverei noutro momento sobre breves encontros. Palestra de Cecília na ABI e Bandeira caminhando lento da Av. Beira Mar em direção à Presidente Wilson, Castelo.
A porta interna do meu armário de vestir era um quadro mural. Colocava ali o que me tocava; textos e fotos. Em 1964, quando Cecília faleceu, fui olhar a foto e a poesia ali presentes;
“Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre, nem triste:
sou poeta”.
Nos anos sessenta e início dos setenta era coisa natural encontrar pessoas como Drummond de Andrade, Bandeira, Alceu Amoroso Lima ou Thiago de Mello andando pelas ruas, gente comum, por onde passávamos. Por onde elas passavam. Por vezes, ia assistir palestras e debates em vários espaços de cultura como o Centro Dom Vital. Ouvir o criminalista Roberto Lyra na Faculdade de Direito, hoje, UERJ, uma glória para o espírito. Que riqueza fazer cursos com o dominicano, francês que se fez brasileiro, Frei Pedro Secondi proferindo verdadeiras conferências sobre Theilhard Chardin. Estas pessoas pertenciam os espaços públicos e nos eram familiares. Conviviam e conversavam solícitos com o próximo.
Clarice Lispector andava em lugares mais discretos, mas andava, por que sei; no Jardim Zoológico a observar os animais. Eu a conheci em casa do artista plástico Darel Valença. Djanira passeava por Santa Teresa apoiada em sua bengala; gostava de estar misturada ao povo que tanto amou. O pintor Loio Persio descia a Rua Aprazível, onde morava, para tomar café no Bar do Arnaudo e o escultor Roberto Moriconi transitando confortavelmente pelo bairro, a pé ou em sua limusine, acenado como bom italiano, era pura alegria.
O Museu de Arte Moderna extensão de minha morada desde sua fundação. A nata das Artes estava semanalmente ali presente. Até meados de setenta aquela festa viva de encontros inesquecíveis entre artistas plásticos e apreciadores das artes transitando no museu, nos ateliês, corredores, jardim e no bar; ponto de convergência. Ir para o museu, trocar ideias ou simplesmente vaguear, era a razão da vida.
Mordaças militares mataram a liberdade de se estar sendo. O MAM nunca mais foi o mesmo. Andar, percorrer as ruas com silêncios guardados, sempre foi direito de todos. Os detentores do sistema excludente não podiam retirar nossos pensamentos invioláveis e ideais libertários. A escuridão da ditadura dispersou os criadores das artes plásticas e da cultura em geral.
Penso em Vinicius de Morais que não era um ícone isolado; Ipanema era sua pátria. Pessoa solícita. Convidado tocou violão e cantou para alunas do tradicional Colégio Jacobina, em 1965, com a maior das generosidades. Antonio Carlos Jobim dava suas caminhadas tranquilamente, só não o via quem não acordasse bem cedo ou nem reparasse um andarilho com chapéu pelo Jardim Botânico atento ao canto dos pássaros e o vento soprando folhagens.
Ipanema uma praça onde a realeza se encontrava; Albino Pinheiro, Fredy Carneiro, Hugo Bidê, Leila Diniz, Maria Vasco. Amava ouvir o guru Luis Carlos Maciel. Havia ainda Olga Savary, Jaguar, Ziraldo e gente que nem mais me lembro. Memórias do meu escaninho.
Glauber Rocha, muito agitado, tinha ponto marcado nos bares entre Ipanema e Leblon. Estávamos juntos no tempo em que eu convivia em sensível amizade com sua irmã, Anecy, que morreu tragicamente em 1977 ao cair num fosso de elevador.
No Cine Paissandu uma geração inteira se cruzava incontinente em sensualidade e charme. Não é saudade, é história.
Helio Pellegrino não se encasquetava no consultório psicanalítico, atendeu clientes enrustidos até mesmo nos bares. Gostava de sentir-se humano, viver sem amarras. Nem tinha preconceitos com a Astrologia profunda. Intelectual doce e meigo.
Nise da Silveira e Mario Magalhães andavam pelas ruas como todo mundo. Entre fatos interessantes foi convidarem Chico Buarque para jantar no eterno Bar e restaurante Lamas. Nise gostava de passear por Jardins com a gravadora Marlene Hori. E sua grande amiga Lia Cavalcanti, acirrada protetora dos animais, costumava frequentar a Churrascaria Recreio, convidando a muitos a beber e degustar, levando para sua casa sobras de carne para seus cães.
Artur da Távola sentado num banco em torno da mesa, no Grupo de Estudos C. G. Jung, era todo atenções para com as sábias palavras de Dra. Nise. Lembranças que ficam tão sutis e meio perdidas. Pessoas notáveis pela singularidade; artistas, andarilhos, poetas e intelectuais, de todo tipo, passaram nas quartas-feiras por este Grupo; porta para o Museu de Imagens do Inconsciente e salto quântico na vida pessoal. Depois dos estudos com Nise, íamos tomar algo nos bares da redondeza numa conversa infindável. As noites de inverno eram quentes, aprazíveis.
As pessoas ricas de saberes e imaginação criativa não andavam em carros blindados, não se esquivavam em carapaças, circulavam entre seus iguais, seres humanos, em beleza e poesia. Gosto imenso do tempo atual onde piso, tendo saudades do atemporal que permanece vivo e presente pela revolução do espírito.
Martha Pires Ferreira, maio, 2012. ________
Foto de Cecília Meireles -  Revista Manchete, anos 60.