Prefácio Livro de Claudia Lisboa / 2013


Claudia Lisboa nos aponta o Cosmo através de seu território astrológico cultural; convida-nos contemplarmos a imensidão do Firmamento deixando que as conexões se façam entre a beleza do macrocosmo e as riquezas configuradas no microcosmo. Uma viagem no tempo histórico; da idade a mais remota à atualidade; visão das imagens arquetípicas expressas na natureza celeste se manifestando na vida terrestre. Vislumbro em seu território de saberes, a qual denominou: Os Astros Sempre nos Acompanham – um pequeno tratado de Astrologia contemporânea, desenhado laboriosamente em cada página, uma profissional atenta aos cânones básicos da estrutura da Astrologia.            

Sua obra é a expressão viva de anos de incansável dedicação aos estudos, observação contínua e atenta ao conhecimento empírico adquirido no exercício de cálculos matemáticos de precisão e análises na execução de Mapas Astrológicos, individuais, e, sua longa convivência teórica e prática ministrando, há anos, aulas com critério didático, bem pessoal; abrindo portas ao desvelar horizontes escritos no céu estrelado e que se revelam efetivamente na vida cotidiana – céu e terra se interagindo. 

Consciente dos conceitos, do sábio suíço C. G. Jung, das leis das correspondências entre o que sucede em nós e o que nos sucede fora de nós; o que se manifesta em nós é desenhado no céu por semelhança. Claudia aborda as várias vertentes que compõe a Astrologia, ponto de partida do princípio da sincronicidade; o que está fora de nós mesmos, se revela em nós. 

          Encontrou seu próprio trajeto de trabalho, seguindo pegadas próprias, sendo fiel a si mesma. Como quem realiza o processo de individuação, de que nos fala C. G. Jung, Claudia sempre se mostrou ser ela mesma, em sua individualidade, sua particularidade. Iniciou sua caminhada no percurso dos Astros – da Astrologia, a mãe de todas as ciências - com a grande mestra que foi Emma Costet de Mascheville. 

         Emma de Mascheville foi a mais Douta da História da Astrologia no Brasil. Não me refiro somente ao seu conhecimento epistemológico e vasta experiência acumulada em anos de atendimento particular e/ou como mestra, mas em especial por sua singular visão de mundo, sua largueza filosófica transmitida generosamente. Mulher que olhava o futuro da humanidade com esperança na compreensão das bipolaridades próprias da vida, certa de que assim é possível reencontrar a harmonia, a unidade primordial. Sempre reflexiva a indagar: “o que nós somos?” Tive poucos encontros com esta preciosa mulher, e percebi que não estava diante apenas da astróloga Dona Emma, mas de um ser humano que pensa, questiona sobre as causas e princípios essenciais da vida; da natureza em sua magnitude. Claudia Hartley Lisboa teve a felicidade de fazer toda a sua formação básica, com esta grande Senhora, que lhe transmitiu o método de estudos e a sede das profundas indagações para a compreensão da vida individual, coletiva e cósmica; a Astrologia em seu significado o mais elevado.  Profética, Dona Emy, carinhosamente assim chamada, apontava os céus e horizontes: “as grandes dificuldades para o final de século irão contribuir para o amadurecimento e evolução humana”. Astrologia, por tanto, a serviço da evolução pessoal e coletiva. 

Os Astros Sempre nos Acompanham nos abrem suas janelas com o olhar para as origens remotas da Astrologia; caminha-se pela Pérsia com suas bases e crenças primitivas. A Mesopotâmia em suas raízes milenares, entre os rios Tigre e Eufrates, quando o conhecimento do Firmamento estrelado se afirma por observações precisas dos sábios imperadores, que eram sacerdotes, astrólogos-astrônomos; os primeiros matemáticos registrando em argila, cuidadosamente, as configurações observadas dos movimentos diários dos astros e faziam suas conexões precisas com o que se passava na vida cotidiana, isto é, nos acontecimentos aqui na Terra. Mostra-nos que contemplar o percurso do Sol, da Lua e dos astros cintilando na imensidão do céu era vislumbramento e reverência religiosa profunda. Os sumérios, assírios, babilônios e caldeus eram sem dúvidas observadores muito meticulosos e perspicazes. Esta riqueza do saber celeste era simultaneamente dividida com outra civilização, não menos importante, o Egito, que por outros meios, simultaneamente, registrou o que se passava no céu e fazendo suas ligações com o que ocorria na Terra. Os egípcios ao contemplar o céu, em seus observatórios, mais ou menos, no mesmo período que os persas, decifraram os mistérios do Zodíaco em sua magnitude física e simbólica, e com outras contribuições importantes. Estes povos se enriqueceram entre eles num período de maior comunicação cultural.

Para os antigos o destino e tudo na natureza que os cercavam estavam “escritos nas estrelas”, mas isso não significava um determinismo imponderável. Estes dois povos foram sem dúvida o berço das observações celestes. Civilizações seguintes aprimoraram culturalmente o saber astronômico e astrológico que se espalhou por todas as nações até os dias de hoje. 

         Depois de percorremos a Índia, o extremo oriente, a América Central e os hebreus, a Grécia com avanços fundamentais e imensa contribuição às bases fundamentais da Astrologia numa convergência de sábios pensadores-filósofos, e Roma democratizando este saber, Claudia nos leva a conhecer um pouco das influências árabes, as culturas que se desenvolveram na idade medieval, até o renascimento, seguindo para os séculos XVII, XVIII, XIX e XX. Ela, já caminhando no terceiro milênio, uma astronauta com o olhar celeste e os pés no firmes chão, nos oferece a cada página de seu livro a complexidade das configurações dos astros e sua aplicação prática.

        Astronomia e Astrologia andavam de mãos dadas até o século XVII. Com o avanço das ciências exatas um distanciamento se deu, mas o saber astrológico seguiu seu rumo com passos silenciosos e constantes como se pode acompanhar.

        Encontramos prazer ao lermos sobre os rudimentos fundamentais da Astrologia, a exposição dos doze signos do Zodíaco e suas polaridades com ampla visão da essência de cada um dos signos com suas singularidades. Posso dar um exemplo, é interessante quando descreve sobre o signo de Peixes e seu signo complementar; “Quando crê em algo, persegue seu sonho, mesmo que todos desacreditem dele. Solitário, segue seu caminho pelos oceanos do seu desejo cruzando as fronteiras ditadas pela realidade objetiva. Diametralmente oposto a Peixes está Virgem, símbolo da análise e da crítica. É importante que Peixes se inspire nestas qualidades, pois na sua falta tenderá a refugiar-se na fantasia, dissociando-a da realidade. Com disciplina e organização tornar-se-á mais objetivo e, assim, poderá acolher as pequenas coisas que a vida exige”. Observa-se aqui uma postura de aconselhamento, e não determinação factual.

        A aceitação e compreensão de energias opostas têm a ver com a aceitação de nossos conflitos, de possibilidade de integração das próprias contradições e complementação de nossa natureza como um todo. Mostra que a interpretação na leitura de um astro ou aspecto no Mapa Natal é justamente no sentido de dar uma indicação possível para a harmonia e o crescimento da pessoa humana diante dos desafios a serem confrontados. 

        Deliciosa imagem ao descrever o irreverente décimo primeiro signo; “Aquário deixa marcas de sua passagem como um vendaval desarrumando o quintal”. 

        Em seu itinerário Claudia aborda com rigor os conceitos chaves dos elementos básicos da natureza e suas triplicidades. As potências do Fogo, Terra, Ar e Água no que pode acontecer de se ter a mais ou a menos, em excessos ou em falta. Trata-se mais uma vez de um olhar atento aos pormenores descrito na imensidão e complexa bagagem que a velha senhora Astrologia nos oferece.

        Ao tratar com amplitude a natureza dos doze signos do Zodíaco, Claudia enriquece ao recorrer à mitologia, descrevendo o mito em seus estágios primordiais, cada um deles; de Áries até Peixes. O mesmo se dando ao escrever pontualmente sobre a natureza dos astros; os dois luminares, Sol e Lua (como personagens centrais) e os Planetas. Acompanhar atentamente na sequência da leitura, páginas por página, apreendemos as riquezas e configurações míticas que define cada um destes signos e astros em seu significado simbólico e arquetípico. Interação das energias masculinas em complementação as femininas expressas nestas fontes vitais. E assim percorremos seu livro com sedenta curiosidade.

        As Casas astrológicas com seu sistema de divisões são descritas em seus conceitos chaves. Pontuando cada casa em sua singularidade, particularidade e as conexões com os astros nelas presentes. Descreve numa passagem referente aos cuidados e acolhimento sobre a presença da Lua em determinada casa: “Já que estamos falando de cuidar e acolher, não podemos deixar de reconhecer o quanto é adequada a relação tradicional da Lua com a casa, espaço físico que nos protege das intempéries, lugar de recolhimento ao qual retornamos para repousar e restaurar as forças empregadas nas tarefas diurnas e, finamente, o “útero” que acolhe e nutre relações de afetividade”. 

        Este pequeno tratado que é oferecido ao público, estudiosos e sedentos de conhecimentos da Astrologia, é marcado por uma postura objetiva e palpável pela experiência didática pontuada como instrumento para o alargamento da consciência. A Astrologia é um dos processos mais ricos e sutis de autoconhecimento, de tomada de consciência do si mesmo. Escrever um livro, não é apenas uma afirmação cultural ou mesmo prazer do ego, é acima de tudo dar o recado, é deixar um legado; é oferecer um presente pessoal e íntimo para o público em geral e, neste caso, também, para a história da Astrologia. Escritos para maior compreensão da natureza humana e da vida em sua totalidade. 

Claudia tem a simplicidade de nos dizer que aprendeu muito na vivência cotidiana. Soube aprender com os clientes, com os alunos/as, na escuta atenta e trocas de ideias, percepções. Firme em seu conceito das polaridades zodiacais ao lembrar a mestra Doma Emma que dizia: “O Escorpião tem duas almas: a da destruição e da regeneração”, e Claudia, por sua vez, afirma: “Acredito que a maioria de nós experimente ao longo da vida um pouco de cada uma”. Entendemos como momentos ou circunstâncias de destruição assim como de regeneração e transformação servem para se alcançar níveis mais elevados de consciência.

É possível amadurecer ao enfrentar os impasses da vida, refletir, observar e superar conflitos com o tempo. Claudia mostra, nas entrelinhas, que viver é um processo contínuo de enfrentamentos de nossos contrários, nossas polaridades escuras e luminosas, ativas e receptivas. E relata que Emma de Mascheville dizia que “Acredito que o mais difícil na área em que o Escorpião está envolvido é lidar com o conteúdo psíquico das regiões sombrias do ser. Por outro lado, lá encontramos as forças criativas, sendo, portanto necessário enfrentar tal conteúdo se quisermos dar vazão a elas. Quando se trata desse Signo nada passa indiferente, tudo vem acompanhado da violência associada a tais potências, da intensidade que faz da vida um palco de emoções tremendamente assustadoras, mas fatalmente atraentes. Por isso é evidente que nessas áreas da vida é preciso um trabalho psíquico que ajude a viabilizar efetivamente o uso positivo das poderosas forças que são criadas por nós”.

Referindo-se ao exercício da escuta nos relata: “Aprendi com os capricornianos que trabalho para eles é o alicerce de suas vidas. Todos, salvo algumas exceções, sentem um enorme desejo de vencer na vida por conta própria. Não se acovardam frente às dificuldades que a realidade lhes apresentou. Muito pelo contrário, em momentos mais tranquilos, o capricorniano se impõe novas adversidades, como se não soubessem viver sem um obstáculo a ser ultrapassado”.


A era iluminista reduziu a Astrologia à racionalidade do determinismo, e por consequência tornou-se fechada em suas teorias fatalistas, perdendo sua riqueza simbólica no campo das probabilidades. É preciso lembrar que na passagem do século XVI para XVII a Astrologia passava por três vertentes para os tipos de previsões. Isso quem nos legou foi Kepler ao dizer que havia a análise: física (corpo), a metafísica (psíquica) e as dos signos (astronomia). Kepler, a princípio, chegou a entendê-la como predestinação, depois, mais observador, passou a ter reservas em relação às pretensões e desígnios da Astrologia tradicional. Acentuava que a função do astrólogo era interpretar os sinais do céu visíveis em relação à Terra, tendo uma postura de aconselhamento, um tanto psicológica/metafísica, diante das possibilidades, por não ousar ser determinista ao afirmar: “não sei com suficiente certeza se poderia ousar predizer confiantemente qualquer coisa específica”, isto é, ser factual. Kepler (1571-1630) fazia Horóscopos e os interpretava como um profissional, dedicado e respeitado. Apreendeu a totalidade da criação, sem divisões entre as energias celestes e terrestres. Matemático na precisão das coordenadas celestes e intuitivo, místico altamente espiritualizado, nas conexões manifestas físicas e emocionais na vida corrente de seus clientes. Kepler sabia disto em relação às probabilidades em relação aos seus consulentes. O iluminismo que se estabeleceu no século XVII é que fechou a Astrologia na racionalidade determinista, cartesiana.  

A Astrologia, apresentada por Claudia, abre portas para a leitura quântica das probabilidades, avança para compreensão larga e fecunda da Astrologia em harmonia com os valores da vida. Não importa se o Sol é o centro do sistema, vivemos aqui, é do ponto de vista da Terra que vislumbramos os movimentos celestes. É a partir na Terra que fazemos nossas referências. É da Terra que procuramos compreender nossa dimensão e responsabilidade existencial. Aqui vivemos e a Astrologia é preciosa como uma bússola para nos orientar nesta caminhada árdua e maravilhosa que é viver a vida em todas as suas dimensões. Somos herdeiros das estrelas há bilhões de anos. No interior do átomo não há códigos ou leis de causa e efeito, o que existe é a imprevisibilidade. Ela se revela através dos ritmos da natureza, e percebemos que cada um de nós participa destes ritmos intimamente e que estamos conectados com todo o universo em sua fonte primordial. 

A Astrologia é ciência enquanto passível de experimentação ao estabelecer cálculos aritméticos da matemática, de precisão, e ela é arte enquanto interpretação de uma linguagem simbólica. A Astrologia pertence ao mundo das alegorias, das metáforas. Cada um de nós é dono de seu próprio destino. O processo de individuação, ser verdadeiramente quem somos, depende de nossos desafios pessoais. O profissional astrólogo, como um Sócrates contemporâneo dirá “conheça-te a si mesmo” e lendo ao fazer as conexões celestes, apenas, ajudará ao seu consulente a conhecer-se e, com sensibilidade, mostrará o horizonte a ser vivido, sem interferências no livre arbítrio. A matéria densa e a sutil não são inseparáveis.  Nenhuma teoria científica pode ser completa às investigações do ilimitado, o mesmo se dá com o saber astrológico. Nenhuma teoria é completa sem integrar o ser observador e o objeto observado. 

        A história das ciências está repleta de críticos maledicentes, que não estudaram e nem absorveram a linguagem simbólica dos céus, estas pessoas não nos interessam, nem merecem falas.

Na história da humanidade são muitos os sábios pensadores, filósofos, artistas, poetas e músicos que apreenderam os sinais dos céus e se beneficiaram ricamente em suas vidas pessoais. Não citarei nada de Dante, Goethe, Hildegard Von Bingen, nem Henry Miller ou Walter Benjamim, mas de um monge beneditino, contemporâneo, Gerard Voss, em sua obra Astrologia Cristã (Astrologie christlich), 1980, Alemanha, ao afirmar que “o horóscopo é uma carta de amor de Deus”, e mais ainda; “o horóscopo, meio de conscientização, não representa apenas um grilhão que prende a pessoa à sua condição humana, mas constitui um processo de autoconhecimento mediante o qual a pessoa descobre o seu eu e o perscruta até que se torne um vaso embora turvo, mas que mesmo assim, contém algo divino, luminoso”.  

Outro sábio que viveu sua paixão pela imensidão do infinito celeste e curtia profunda simpatia pela linguagem simbólica dos astros foi Albert Einstein que dizia: “Os domínios do mistério prometem as mais belas experiências”. E ainda: “Uma proposição é correta quando, dentro de um sistema lógico, é deduzida de acordo com as regras aceitas da lógica. Um sistema tem conteúdo de verdade de acordo com a certeza e a inteireza da possibilidade de coordenação com a totalidade da experiência. Uma proposição correta tem a sua ‘verdade’ adquirida por empréstimos ao conteúdo de verdade do sistema a que pertence”. 

         

A astrologia não é um saber para se acreditar ou negar credibilidade, e sim um saber tão antigo quanto a história da humanidade a ser constatado. Quando dois ou mais planetas se interagem no céu geometricamente configurados entre si, podemos constatar simbolicamente, por correspondência, acontecimentos na vida terrestre, por sincronicidade. É a lei das correspondências. É nesta vertente que o Cosmo nos habita - que Os Astros Sempre nos Acompanham - que a astróloga Claudia Lisboa nos presenteia neste ano de 2013, quando o mundo em sua totalidade, em plena efervescência, quer horizontes objetivos para a compreensão dos valores essenciais da vida humana. 


                                                   Martha Pires Ferreira / verão, 2013.

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