Escritos dispersos de Nise da Silveira. Edição: Cadernos da Biblioteca Nacional, 2008 – RJ.
II – Anexo - Palavras de Nise. “O inconsciente é um imenso oceano, por vezes emergem umas imagens”. “A psique humana é um fenômeno fantástico. A capacidade criadora é extraordinária.”
Dra. Nise gostava mais de ouvir do que de falar. Um rádio; ela gravava tudo. Observava cada pessoa nos olhos; os gestos, as atitudes: “Está gata já lhe adotou, pode ficar.”
“As pessoas que amam o poder, o comando, não gostam de gatos. Os gatos são seres livres, não seguem normas. Veio aqui uma senhora cheia de empáfia para eu participar de um grande evento internacional que ela está organizando, acontece que de imediato demonstrou aversão aos gatos, foi o suficiente para eu fizer, ‘não posso, os gatos não permitirão’. Ela foi embora sem entender nada.”
“Meus livros de arte são instrumentos de trabalho. Tenho grandes paixões, Leonardo da Vinci é um deles. Sou particularmente apaixonada é por Rembrandt. Ele mergulhava profundamente como Leonardo. Observe a pintura dele. Se você sonha, você mergulha - o da vigília e o do sonho - dois mundos.”
“O artista, o poeta, mergulha no inconsciente e volta. Já o doente, o louco, não tem o bilhete de volta. Essa é a diferença.”
“Sempre me dirigi aos doentes pelo nome, jamais os chamo de pacientes. Eu os trato como seres humanos, pessoas. A palavra paciente me irrita muito.”
“A inteligência e a sensibilidade do esquizofrênico permanece intacta mesmo na aparência de estar cingida, em ruínas. Verifica-se isso com clareza quando encontra alguém com quem ele possa se relacionar afetivamente.”
“Não sei fazer nada sem procurar uma base mais profunda, sem ler, pesquisar. As referências são fundamentais.”
“Nosso objetivo principal é entrar no mundo interno do doente, é conhecer este mundo e que ele entre em contato conosco. Não é desejo de que o doente se expresse de forma artística, o que nós queremos é que ele se expresse em imagem, como linguagem. O simples fato de desenhar ou modelar é terapêutico. Ele fica mais leve, diminuem o medo e as tensões.”
“Em matéria de educação não basta conhecer o mundo externo, é necessário tomar seriamente em consideração a função imaginativa ao dar forma a conteúdos do inconsciente.”
“A palavra que mais gosto é liberdade.”
“O simples fato de pintar despotencializa a angustia dos doentes. Observando as imagens percebe-se, mesmo sem que haja uma tomada de consciência. Eles se sentem mais aliviados. Plasmando com as próprias mãos, a pessoa doente vê que as imagens são menos apavorantes. Vê-se uma considerável melhora na vida pessoal, nas relações externas.”
“Produzir imagens expressas em emoções já é por si terapêutico, é remédio. Prefiro as atividades expressivas à camisa de força química. Não que seja contra os remédios, longe de mim, mas sou avessa às doses elevadas de psicofármacos.”
“Aprendi mais com a literatura do que com os trados de psiquiatria. Um conto de Machado de Assis, Missa do Galo, exprime com mais clareza e sutileza as coisas do que um psiquiatra. Aprende-se mais com Machado de Assis sobre a natureza humana do que em livros de psicologia.”
“Gosto de mergulhadores, pessoas que estudam a fundo o mundo interno. A maioria das pessoas tem medo do inconsciente, ficam na superfície. Preciso de mergulhadores com escafandro. Quem quer estudar psicologia que compre um escafandro e mergulhe com o
esquizofrênico.”
“É necessário se espantar, se indignar e se contagiar, só assim é possível mudar a realidade.”
“Eu me sinto bicho. Bicho é mais importante que gente. Pra mim o teste é o bicho, se não passar por ele, não tem vez. Freud disse que quem pensa que não é bicho, é arrogante.
Alguém perguntou: “Dra. Nise quantos gatos a senhora tem?” Respondeu: “Nenhum,” fez uma pausa constrangedora e continuou, “Gatos não se têm, atualmente, convivo com cinco gatos.” E foi dizendo o nome dos gatos; Vivaldi, Bruna, Madre Superiora,... e se não erro, disse que já teve 17 gatos ao todo; Mestre Onça, Elci, Mafalda, Tigre Rei, Lord Byron, Narcisa, (nota de 1978). Teve entre outros; Helena, Léo, Che, Miele, Raphael, e o último que se chamava Carlinhos.
“Estou apaixonada. Sempre me apaixonei”. Estava com as obras completas de Murilo Mendes sobre a mesa quando cheguei a sua biblioteca. “Leio Murilo Mendes como uma oração. Em Roma ele me disse ao nos despedirmos ‘Até breve, até outra galáxia’. Eu era sua irmã sobrenatural.” (1994)
“O silêncio é fundamental. E para criar, é preciso privacidade.”
Senhora das imagens internas, Escritos dispersos de Nise da Silveira (15 ensaios de Nise) --- Organização: Martha Pires Ferreira
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2 comentários:
Martha
Parabéns pelo livro. Já está aqui em casa um exemplar para devida leitura.
Um abraço
Marcus Borelli
Marcus Borelli,
Cada texto da sábia Nise da Silveira é um primor; jóias do pensamento e do coração.
Abraço afetuoso, martha
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