terça-feira, 31 de julho de 2007

Conceito de Self para Carl G. Jung

O núcleo central da psique, Carl Gustav Jung denominou de Self.
Para que se possa entender o sentido lato do conceito de Self, centro fundamentalmente ordenador de energias, Jung aponta uma direção; o autoconhecimento. É através da experiência vivida no cotidiano que o ser humano se conhece e chega a este centro. A via a percorrer se faz através do que ele chamou de Processo de Individuação, o caminho do conhecimento do si - mesmo.
O processo da vida se desenvolve com o tempo. A vida como um todo se realiza na medida em que cada um de nós procura se conhecer externa e internamente. O desenvolvimento da natureza física, do emocional e do espiritual se dá simultaneamente. O encontro com o Centro / Self pode ser visto como algo que nos transcende. Poderíamos dizer que é um encontro com a totalidade de nosso ser, com as camadas mais profundas do inconsciente.
“Todo ser tende a realizar o que existe nele, em germe a crescer, a completar-se. Assim é para a semente do vegetal e para o embrião do animal. Assim é para o homem, quanto ao corpo e quanto à psique”; palavras de Nise Magalhães da Silveira. Impulsionado por forças inconscientes, o ser humano toma consciência de sua natureza. Cada um de nós na medida em que vivemos a vida fazemos livre escolhas e tomamos decisões. Tudo em nós é um convite ao desenvolvimento das potencialidades inatas.
Quanto mais conscientes somos de nossas potencialidades, mais claramente percebemos o caminho a percorrer. É um processo em contínua dinâmica, como um espiral em expansão.
A Mandala, palavra sânscrita, significa círculo sagrado. É a configuração perfeita da imagem arquetípica do Self. Seu simbolismo inclui toda imagem concentricamente disposta, circunferência ou quadrado, tendo um centro. Para a cultura oriental a Mandala é a representação do centro da totalidade psíquica. Jung aponta o centro da Mandala como representação do Self.
Toda a descoberta e teoria de Carl G. Jung foram formuladas a partir de experiências empíricas observadas e vividas ao longo de sua vida. Seu conceito de Self não foi uma formulação intelectual, mas sim experiência real a partir das potencialidades do inconsciente pessoal e do inconsciente coletivo, substrato comum a todos os seres humanos.
O caminho para a realização do si - mesmo não é uma trajetória fácil. Muito pelo contrário, pode ser cheio de sacrifícios e dificuldades tão grandes que pensamos ser impossíveis de serem solucionadas. O processo de individuação é o processo de depuro de nossa própria existência que se revela a cada dia.
O ser em sua completude é aquele que conseguiu aproximar e colocar em ordem os dois lados da natureza humana; luz e sombra, masculina e feminina. Aquele que realizou esta aproximação de energias é um ser que se aperfeiçoou, sem a pretensão de tornar-se perfeito. Para Jung não existe o ser perfeito.
A trajetória para a plena realização do autoconhecimento é sinalizada por Jung por etapas. A 1ª etapa é o desvendamento da Máscara, é a falsa roupagem da persona que precisa ser retirada, é se assumir exatamente como se é. A 2ª etapa é encarar de frente a Sombra, o lado escuro e sombrio que não gostamos, e menos ainda, de mostrar porque nos desagrada [a Sombra pode ser luminosa, é o outro lado da pessoa que por viver uma vida obscura não consegue enxergar ou dar valor ao seu lado criativo e bom]. A 3ª etapa é o confronto com os opostos, Anima [para o homem] e Animus [para a mulher]. Com a integração desses dois lados o homem se torna mais flexível, mais sensível e sábio nas atitudes, e, a mulher mais harmoniosa nos afetos e intelectualmente com maior interesse pelo universo da cultura.
O Processo de Individuação não pode ser confundido com individualismo. Individualismo pressupõe um ser de conduta egocêntrica, pensando mais em seus planos pessoais. Individuar-se é querer diferenciar-se de tudo o mais que não seja viver com autenticidade. É ultrapassar o vislumbre da auto-referência. É libertar-se de artifícios, exige de cada um de nós o incansável confronto de nossas energias opostas; o mundo objetivo e subjetivo, o agradável e o desagradável de nossos impulsos naturais. As forças positivas e negativas existentes em nossa natureza humana devem ser observadas. Estas forças opostas precisam ser integradas. Não matamos a “fera” que possa existir dentro de nós e sim a “assimilamos”. Chegar ao Self é tornar-se uma pessoa mais completa, autêntica. Uma conciliação feliz de nossa natureza como um todo.
Quando nos aproximamos do nosso núcleo, ou somos aproximados por ele, pelo Self, naturalmente nos colocamos diante da vida com uma postura pessoal mais solidária. Somos mais perceptíveis e engajados nas questões do mundo, no meio social em que vivemos. Passamos a ter um compromisso efetivo na sociedade. Percebemos que a base da vida psíquica á a mesma para toda a humanidade. A fonte da vida é a mesma para todas as espécies. Somos um pouco o outro.
Vivendo a vida, as nossas relações interpessoais mudam. Projeções são feitas e desfeitas na medida em que vivemos. Percebemos que cada um de nós trás o seu quinhão, seu mistério. A vida pessoal é repleta de complexidades e de segredos. Com isso temos mais respeito pelas pessoas que nos cercam. Percebemos que cada um de nós é diferente. Quanto mais nos conhecemos mais aceitamos os outros como eles são. Somos menos críticos e judicativos, mais humanos por conseqüência.
Sabemos com a árdua caminhada que aproximar da fonte ordenadora de energias nada mais é do que vivenciar a experiência de que Deus vive em nós e nós vivemos nele. É a experiência do Tao para os místicos da cultura chinesa e do Brahma para os hindus.
O Self não é apenas o Centro ordenador da psique pessoal, Ele é o Centro da totalidade da vida; o Alfa e o Ômega (Apoc. 22,13). Para o cristão, em sua vivência a mais radical, esta experiência interna é a experiência do incognoscível. Impossível encontrar palavras que possam expressar este estado do ser. É como que beber na fonte do Sagrado. A imagem arquetípica do cristianismo é a de Jesus de Nazaré.
Jesus, o Cristo, é o Ícone por excelência.

[Palestra Martha Pires Ferreira 28/04/2007 – Meditação Cristã]

5 comentários:

Lucio Massafferri Salles disse...

Muito bom o texto Marta. Pensei então, a imagem arquetípica do budismo ser Siddharta Gautama, porque não? Belo o significado de Mandala, eu não sabia...Um grande beijo para você, do Lúcio

Giovanna e Beto disse...

Martha,
Que saudades! Seu texto está lindo! E é sempre bom "ouvir" sua voz! Beijos da Giovanna, do Beto e do Bento!1

Anônimo disse...

Realmente ao me identificar com algo ou alguém, o exterior e o interior são ativados, como assim ressaltou Jung relatado por você, Marta.Mas é preciso muita vivência cítica e auto-crítica para poder fazê-lo em toda plenitude.
Beijos
Eva

denise senra disse...

Martha,
que estupendo!
Senti vontade de te ler e vim descendo as ruas da poesia e encontrei o lindo texto do Self que me completou.
Como aqui nos diz que podemos transcrever as matérias publicadas desde que citada a fonte, concluo que o texto pode "viajar" comigo.
Que ótimo!
Nossa, que sincronicidade, desejando o texto e não é que vim parar aqui nele? Não vim por isto. Fui lendo aleatoriamente e supresa boa: ei-lo.
Martha, Jung é tudo que sempre quis para minha alma (errôneamente buscava respostas fora de mim e com ele aprendi que não é assim) o encontrei de forma comovente e definitiva em 2007.
bj
denise

Anônimo disse...

bom comeco