Giotto _ séc. X
Soneto de Natal
Machado de Assis
Um homem, — era aquela noite amiga,
Noite cristã, berço no Nazareno, —
Ao relembrar os dias de pequeno,
E a viva dança, e a lépida cantiga,
Quis
transportar ao verso doce e ameno
As sensações da sua idade antiga,
Naquela mesma velha noite amiga,
Noite cristã, berço do Nazareno.
Escolheu o
soneto... A folha branca
Pede-lhe a inspiração; mas, frouxa e manca,
A pena não acode ao gesto seu.
E, em vão
lutando contra o metro adverso,
Só lhe saiu este pequeno verso:
"Mudaria o Natal ou mudei eu?"
Texto extraído do livro
"Poesias Completas - Ocidentais", 1901, pág. s/nº.
*****
Poema de Natal
Jorge de Lima
Ó Meu Jesus, quando você
ficar assim maiorzinho
venha para darmos um passeio
que eu também gosto das crianças.
Iremos ver
as feras mansas
que há no jardim zoológico.
E em qualquer dia feriado
iremos, então, por exemplo,
ver Cristo Rei Corcovado.
E quem
passar
vendo o menino
há de dizer: ali vai o filho
de Nossa Senhora da Conceição!
— Aquele
menino que vai ali
(diversos homens logo dirão)
sabe mais coisas que todos nós!
— Bom dia, Jesus! – dirá uma voz.
E outras
vozes cochicharão:
— É o belo menino que está no livro
da minha primeira comunhão!
— Como está
forte! – Nada mudou!
— Que boa saúde! Que boas cores!
(Dirão adiante outros senhores.)
Mas outra
gente de aspecto vário
há de dizer ao ver você:
— É o menino do carpinteiro!
E quando
voltarmos
pra casa, à noite,
e forem pra o vício os pecadores,
eles sem dúvida me convidarão.
Eu hei de
inventar pretextos sutis
pra você me deixar sozinho ir.
Menino Jesus, miserere nobis,
Segure com força a minha mão.
Alagoano, Jorge de Lima (1895-1953). Poemas Escolhidos (1925-30), estabelece uma relação de grande
proximidade entre os homens e o Menino Jesus.
Poema
de Natal
Vinicius de Moraes
Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
Vinicius de Moraes, "Antologia Poética", Editora do Autor - RJ, 1960.
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