Martha Pires Ferreira / maio, 1999.
Poucos param para pensar na importância dos Contos de Fada, seu sentido totalizante. Pouco se pensa o que significa em sua riqueza cada um dos símbolos dessas histórias, como os anéis, tapetes, varinhas de condão, espelhos, talismã ou maçãs de ouro.
A palavra Fada vem de Fata, do latim Fatum, “destino”. Fada, deusas do destino. Remete ao destino do herói/heroína. Os Contos de Fada são contos do destino, sob as mais variadas versões. Fundamenta-se na mesma base essencial que é a busca da totalidade psíquica. Importante é apreender o significado globalizante das histórias.
Os Contos de Fada têm origem nas profundezas do inconsciente e é comum à psique de todos os povos, de toda a humanidade. Os Contos de Fada são tão antigos quanto à história do homem. Há vestígios de histórias há mais de 20.00 anos. Pesquisadores registram velhos contos desde o Egito e a Babilônia. Contar os Contos é sempre resgatar a narrativa oral, é transmitir o maravilhoso que habita as histórias, é manter ensinamentos e princípios de conduta que na Antiguidade pertenciam às Escolas de Mistério.. São histórias repletas de enfoques ecológicos - a Natureza está sempre presente no percorre da narrativa - florestas, riachos, rios, montanhas, rochas, cavernas, vales, macieiras repletas de maçãs de ouro, hortaliças, roseiras, pessegueiros, e muitos outros elementos associados ao fogo, terra, ar e água.
Os Contos de Fada pertencem ao universo das realidades subjetivas, do mundo arquetípico. São verdades do mundo imaginário. Nos Contos encontramos a tentativa difícil, porem possível de aproximar o maravilhoso que habita as histórias, os nossos opostos consciente e inconsciente, realidade e imaginação. Elementos objetivos e subjetivos se confrontam; o princípio feminino e masculino, o bem e o mal, a sombra e a luz. Realidades contrárias que se confrontam e se completam. Na tradição popular costuma-se dizer; “dedos de fada”, ou “mãos de fada” para quem tem habilidades incomuns capazes de realizar belezas manuais.
Gostamos de ouvir histórias porque elas falam profundo, tocam matrizes de nossa natureza interna, tocam nossas emoções, nos encantam por serem histórias maravilhosas no universo da fantasia, repletas de sabedoria e ensinamento. Não são moralistas, embora tenham um fundo moral, princípios éticos. São princípios carregados de afetividade que tocam as emoções.
Os Contos de Fada são metáforas; dizendo algo quer indicar outros valores, outras maneiras de ser. São histórias simples e espontâneas, porém riquíssimas em símbolos, sinais, alegorias. São espelhos das tramas e experiências humanas.
Os contos não podem ser lidos ou ouvidos com os filtros da racionalidade, da lógica cartesiana. É preciso predisposição intuitiva para narrar. É necessário sensibilidade sem defesas. A postura é ouvir sem pensar, apreender sem análises, saborear como dádiva, beleza do encantamento.
Os Contos de Fada não são mitologemas, mitos, sagas, fábulas. Os Contos pertencem às riquezas do mundo folclórico, do imaginário popular.
II - Estrutura dos Contos de fada
Geralmente os Contos começam bem, com certa harmonia, depois tudo fica difícil para o personagem central, seja um herói ou uma heroína. Tanto um como o outro indiferentemente, terá que passar por dificílimos obstáculos, grandes desafios são enfrentados sozinhos sem qualquer ajuda divina ou de uma simples pessoa. A meta do herói não se realiza sem primeiro ter que enfrentar o monstro da solidão. No momento do mais terrível abandono surge um personagem ou situação sobre-humana ou sobrenatural que surge em auxílio do herói - pode ser um velhinho ou uma velhinha na estrada, um animal com poderes. Presentes com poderes mágicos; varas de condão, almofadinhas, talismãs, etc.. Objetos poderosos que ajudam o personagem central da história vencer os obstáculos, os impedimentos, e realizar sua meta final.
Obedecer a um personagem desconhecido que aparece nos caminhos ou mesmo a um animal significa viver e obedecer às forças instintivas que vivem em cada um de nós - o sadio, o salutar, que não responde à racionalidade. Obedecer a estes personagens que surgem é obedecer à voz da natureza. Ouvir e seguir os conselhos da raposa, da serpente ou de um peixe é seguir a vida instintiva, é ir à busca de sua totalidade, de sua complementação. O processo percorrido pelo personagem central nos está mostrando o que representa como metáfora, o processo de individuação na psicologia analítica de C.G. Jung. O mito do herói é a tomada de consciência da luta entre as trevas, as sombras e a luz, o entendimento - a busca da integração de nossos aspectos masculinos e femininos. Podemos acompanhar todo o processo de individuação através dos Contos de Fada.
A grande colaboradora de Jung, Marie-Louise von Franz foi sem dúvidas a maior conhecedora da importância dos Contos como instrumento para se entender a integração da totalidade humana, que não pode ser decidida pelo ego, mas somente por uma entrega à forças desconhecidas de nossa própria psique. Ao ultrapassarmos os mais terríveis e obscuros conflitos, as realizações internas e externas se fazem nos colocando num outro nível de consciência mais nobre e elevado.
Geralmente o herói tem que viver três etapas de provas, três situações semelhantes, mas é na realização da quarta etapa que se dá a complementação, a união, o casamento, o desfecho final - quaternio. O que no processo alquímico chamamos de Opus Alquímico - a realização complementar entre o Rei e a Rainha, a integração dos princípios masculinos e femininos.
O final dos Contos de Fada geralmente nos aponta que, depois de realizado o destino (fatum) percorrido com suas dificuldades e vencendo obstáculos quase intransponíveis, é possível alcançar a realização da felicidade. O que se espera e se deseja é a melhor realização possível dos nossos projetos de vida.
Assim nos apontam os Contos de Fada... E foram felizes para sempre.
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Um comentário:
Marta voce é uma rainha dos contos de fada,mistura de feiticeira,fada,
bruxa tecendo comentários e narrando hist´rias és capaz de filtrar este universo mágico.
Um beijo da amiga e admiradora,
Ana Luiza Motta.
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